domingo, 15 de julho de 2012

Milagre de Inverno


A neve fina caía. Estávamos no final de um inverno seco. Os campos estavam lotados deles. A casa que nossa família e o General ocupava ficava ao lado das câmaras.

Minhas duas filhas estavam brincando na neve fina, correndo e rindo uma da outra. Brenda tinha 9, Gretta tinha 11.

Um soldado se aproximou de repente, bateu uma continência.

- Senhor estamos aguardando sua ordem, todos os preparativos estão prontos.

A verdade é que eu não compartilhava daqueles ideais. Todo dia era um sofrimento que me devorava por dentro, ver aquelas pessoas. Não ver de verdade por que a câmara não tinha janelas, mas saber que elas estavam ali. Saber o que ia acontecer a elas. Saber que as meninas estavam crescendo no meio de tudo isso.

- Tio, não é tarde ainda. Mordi meu lábio.

- O senhor pode dar a ordem para pararem.

O General não moveu um músculo do rosto. Depois me olhou com seus olhos duros.

- Não me chame de tio na frente dos soldados.

Virou-se para o soldado.

- Acenda a fornalha.

O soldado fez um sinal e se afastou.

- Gunther. Sei o que pensa todos os dias. Sei que não gosta de estar aqui. Mas é assim que as coisas são.

Meu tio estava de costas para mim. Tirou as luvas e esfregou um pouco as mãos.

- Que ninguém ouça você falando suas besteiras sobre poupar esses porcos. Sabe o que aconteceria se isso chegasse aos ouvidos de alguém da SS não sabe?

Fiz um sinal afirmativo.

- Talvez não seja algo limpo. Mas eu estou aqui e você está aqui também. São tempos escuros esses. Mas estamos ambos do lado que vai vencer, somos os escolhidos.

As chaminés expeliram uma nuvem negra e pesada. As paredes eram grossas e não podíamos ouvi-los gritar. Mas eu sabia que estavam gritando.

- Você e as crianças nasceram do lado certo não é maravilhoso? A vida, Gunther, é uma coisa maravilhosa. Pequena e maravilhosa. Cada pequeno dia é um milagre não é mesmo? Todo homem e mulher no mundo possui um destino, uma força invisível que os guia ao longo da vida, sem ter qualquer certeza sobre o valor de nossas vidas diante da grandeza do plano traçado para nós. Mas alguns são como eles. Raças impuras, indignas de viverem junto conosco. Pare de tentar buscar algum sentido nisso tudo. Eu estou aqui, você também, faça o que lhe for ordenado. E agradeça a Deus se encontrar alguma beleza em meio a tudo isso.

Brenda parou de correr e começou a falar alto.

- Papai, papai olhe! Está nevando! O Senhor disse que não ia nevar mais esse ano, mas está nevando. É um milagre!

Gretta colocou a língua pra fora e apanhou um floco.

Eu não sorri. Um floco caiu na minha mão. Um pouco branco. Um pouco negro.

O marechal sorriu.

- Isso mesmo Brenda, está nevando. Estão nevando pessoas.

Nenhum comentário:

Postar um comentário